segunda-feira, 6 de abril de 2009

O Observador e o Intérprete

Foto por Lorena Martins


Marçal Aquino
nasceu em Amparo, no interior paulista, em 1958. Como jornalista, trabalhou nas redações de "O Estado de São Paulo" e do "Jornal da Tarde". Publicou, entre outros livros, os volumes de contos "Faroestes" e "Famílias terrivelmente felizes", além do romance "Eu receberia as piores notícias dos seus lindos lábios". Atuou como roteirista em filmes como "Os matadores", "O invasor", "O cheiro do ralo" e "Cabeça a prêmio". Em 2009, recebeu o Prêmio Shell de Dramaturgia pela peça "Amor de servidão", escrita em parceria com Marília Toledo.

Na entrevista, concedida por e-mail, o jornalista e escritor fala, dentre outras coisas, do orgulho de ter feito parte do Jornal da Tarde, um templo do New Journalism no Brasil entre os anos 70 e 80, da influência do jornalismo em sua literatura e da diferença entre seu olhar de jornalista e seu olhar de escritor.


***



Como jornalista, você sempre trabalhou em veículos de mídia impressa. A opção pelo trabalho nesse meio foi uma maneira de estar mais próximo da literatura?

Marçal Aquino –
Descobri cedo que queria ser escritor - e também descobri cedo que isso não é profissão. Então me inclinei para o jornalismo, com foco exclusivo na mídia impressa, porque meu negócio era escrever.

Quais as mudanças mais significativas ocorridas no jornalismo da época em que você atuou em redações para os dias de hoje?

Marçal Aquino – O texto nos jornais me parece hoje mais telegráfico, despido de qualquer adereço - salvo as honrosas exceções de sempre. Ou seja, são textos que, embora muitas vezes assinados, não possuem uma marca distintiva clara. Vejo uma espécie de homogeneidade. E colunas, muitas colunas.
E a literatura brasileira? Como ela se caracteriza neste início de século XXI?


Marçal Aquino – Acho que há uma série de escritores que estão fazendo uma espécie de registro imediato da degradação que nos cerca. Com uma ou outra exceção, o realismo reina.


Você trabalhou na redação do Jornal da Tarde, considerado um templo do New Journalism (aqui chamado de Jornalismo Literário) no Brasil. Como foi essa experiência?


Marçal Aquino – Foi uma experiência maravilhosa, sobretudo porque convivi (e aprendi muito) com nomes legendários do jornalismo brasileiro. Gente como Ivan Angelo, Fernando Portela, Marcos Faermann, Percival de Souza. Quando repórter, eu era incentivado pelo meu editor a dar um tratamento literário à narrativa noticiosa. Havia também aquele culto à imagem, que permitia ao jornal edições magníficas. Tenho muita saudade daquele tempo. Durante o dia, eu escrevia com fé de peregrino um romance - que, afinal, nunca saiu - e à noite ia pra redação trabalhar na edição de um jornal que dava orgulho ver na banca no dia seguinte.

Pode-se considerar o New Journalism uma forma de literatura? Ou seria simplesmente o jornalismo influenciado pela linguagem literária?

Marçal Aquino–
Da maneira como é definido por gente como Gay Talese, Norman Mailer e Tom Wolfe, é o momento em que o jornalismo se permite contaminar pela literatura de modo pleno. Houve até anti-narrativas, como é o caso daquele artigo do Talese sobre o Frank Sinatra. Acho uma boa maneira de definir o negócio. É um jornalismo que não almeja ser literatura, apenas se permite enunciar de forma literária.

A temática urbana, a concisão narrativa e de linguagem, características marcantes de sua obra, advêm de seu trabalho como jornalista?

Marçal Aquino –
Certamente meu trabalho de jornalista, tanto como repórter quanto como redator, influenciaram a minha literatura. A concisão e a maneira de olhar devem algo ao jornalista.


De que maneira a linguagem jornalística e a literária podem se dialogar melhor nos dias de hoje?

Marçal Aquino –
Se falarmos da mídia impressa, com os jornais em papel perdendo cada vez mais público para a internet, uma saída seria valorizar-se com bons textos, boas coberturas, reportagens que fugissem à mera cobertura do dia-a-dia. Isso seria um diferencial que não é encontrado na internet. E o tratamento literário dos textos jornalísticos certamente seriam uma atração, enfatizando o prazer de ler.


O Marçal Aquino jornalista enxerga a realidade da mesma forma que o Marçal Aquino escritor?

Marçal Aquino –
O jornalista vê a rua; o escritor a interpreta com a imaginação.



Danilo Thomaz