domingo, 7 de junho de 2009




A Construção da História

1.

O Presidente


Getúlio propôs:
“Por que tu não fazes um jornal?”

Samuel Wainer havia avisado Vargas que a imprensa era sua inimiga e que, nela, ele só seria má notícia. O ano era 1951. Getúlio era novamente presidente, pela primeira vez eleito democraticamente, apesar da oposição de todos os veículos jornalísticos da época. Samuel e ele haviam se tornado amigos há dois anos, na fazenda Santos Reis, em São Borja, cidade natal de Vargas, no Rio Grande do Sul. Ali, Wainer realizara a entrevista que trouxera Getúlio de volta à cena política brasileira e, dois anos depois, ao poder. Desde então, o político gaúcho pretendia recompensá-lo.




Samuel Wainer e Getúlio Vargas



Em março de 1949, Assis Chateaubriand havia incumbido Wainer de ir até o interior do Rio Grande do Sul para fazer uma grande reportagem sobre o trigo. Nela, o repórter teria que provar que o Brasil jamais poderia ser autossuficiente na produção da commodity, como interessava a Chateaubriand.

Após entrevistar fazendeiros, produtores e técnicos, Wainer concluiu que a posição de seu chefe era insustentável. E que, pior ainda, seria não defendê-la em O Jornal, veículo onde trabalhava dentro dos Diários Associados, conglomerado de mídia de Assis Chateaubriand.

“Salvou-me desse impasse”, afirma Wainer, “a providencial ideia de tentar uma entrevista com Getúlio Vargas”, pois, ao chegar a São Borja, o repórter do O Jornal havia sido informado que o ex-presidente e atual senador da República pelo Rio Grande do Sul vivia ali e não falava com a imprensa há dois anos, desde 1947.

Getúlio aceitou recebê-lo. “Ele [Samuel Wainer] estava no lugar certo, na hora certa. A entrevista com Getúlio Vargas foi um grande golpe de sorte, que comprova isso. Ele estava próximo dele no momento em que ele diria tudo aquilo para o caseiro, até mesmo para uma cabra.”, afirmou o jornalista Augusto Nunes, autor de Minha Razão de Viver, o livro de memórias de Samuel Wainer. Na entrevista, Vargas falou sobre o momento político do Brasil – a respeito do qual era informado em sua propriedade – e sentenciou:

“Eu voltarei”

A comoção nacional iniciada com a publicação da entrevista – que fez O Jornal 180.000 exemplares, quando sua tiragem média era de 9.000 – levou Vargas a cumprir a promessa. Ele venceu as eleições realizadas no dia 3 de outubro de 1950 com 48,7% dos votos, derrotando Eduardo Gomes, da UDN (União Democrática Nacional), que obteve 29,7% dos votos e Cristiano Machado, do PSD (Partido Social Democrata), com 21,5% dos votos.


Uma grande vitória, sobretudo pelo completo isolamento midiático em que foi colocado Vargas ao longo da campanha eleitoral. Segundo Nunes, “A vitória de Getúlio em 1950 prova que imprensa não é o quarto poder. Tanto que não apenas Getúlio fora eleito em oposição a ela, mas também Leonel Brizola [para o governo do Rio de Janeiro, nos anos 80], e o Lula [para a presidência da República], em 2002. Ela não manda, mas pode atrapalhar muito. A imprensa a favor de um governo só não é pior que o humor a favor. Por isso, o Luis Fernando Veríssimo matou a Velhinha de Taubaté, uma personagem excelente, divertidíssima. Ela acreditava em tudo aquilo que os outros governantes diziam. Quando Lula ascendeu e estourou o escândalo do mensalão, ela iria acreditar também, sendo que o Veríssimo apoiava o Lula e o PT? Não tinha como. Por isso ele a matou e justificou dizendo que era o fim de qualquer esperança. “O Pasquim”, por sua vez, morreu com a ascensão do Brizolismo. Eles apoiavam Leonel Brizola, quando ele ascendeu, não havia mais a quem criticar, com quem brincar.”

O retorno de Vargas à cena política, como presidente da República, deixou Samuel orgulhoso de si. Ele, agora, via agora outro Getúlio. Não o considerava mais a “encarnação do mal”, como nos tempos do Estado Novo, quando Vargas anulou a Constituição de 1934 e, apoiado pela classe dominante, governou o país de maneira ditatorial, com a imprensa e a propaganda sob censura e a repressão de movimentos sociais. Para Samuel, Getúlio, nesse período de reclusão, havia se tornado um nacionalista convicto, consistente, disposto a consolidar a burguesia nacional e fazer justiça social.

Iniciado no dia 10 de novembro de 1937, com o impedimento da entrada dos parlamentares no Congresso e a leitura da nova Carta Constitucional, o Estado Novo durou até a renúncia de Getúlio, em 1945, quando o presidente não tinha mais condições de manter-se no poder, dadas as pressões que sofria dentro e fora do governo.

Nesses oitos anos de ditadura, foram criadas a Rádio Nacional – que veio a se tornar a maior e mais influente do Brasil – e, no final do governo, os partidos que comporiam a cena política do Brasil até o golpe de 1964: o PSD, o PTB (de Getúlio e JK) e a UDN, a principal oposição a Vargas e JK, liderada por Carlos Lacerda.

E era essa oposição protagonizada por Lacerda que desejava impedir a posse de Getúlio em 31/01/1951, o que preocupou os aliados do presidente eleito e sua filha, Alzirinha Vargas. Ao saber desses rumores, Getúlio não se preocupou. Apenas se precaveu. E pediu a Samuel:

“‘Bem, tu conheces o meu pensamento. Redija a entrevista, com pergunta e reposta e, logo mais, após o jantar, vamos revê-la em conjunto’”.

Nela, “Vargas” prometia respeitar a democracia, reafirmava a crença nas Forças Armadas Brasileiras, acenava para a oposição e prometia acordos de paz com os Estados Unidos. Após lê-la, o presidente eleito disse ao jornalista:

“‘Espero te recompensar pelos serviços que me prestasse’”, outra promessa cumprida, pouco tempo depois de tomar posse como presidente da República.

Os companheiros de Vargas, porém, não eram os únicos com aflições para cuidar após sua eleição. Ao vê-lo novamente no poder, Chateaubriand (vulgo Chatô) assustou-se. Mesmo assim, decidiu seguir em frente com a tradição de manter boas relações com quem estivesse no poder e pediu a Wainer que o apresentasse a Getúlio. Wainer aceitou.

“Uma rara insegurança tomou Chateaubriand”, conta Samuel no livro. Mas esta se desfez logo, no contato com Getúlio. “Vargas era um animal político destituído de emotividade, não tinha reminiscências, não tinha idiossincrasias. Getúlio não teria, portanto, maiores problemas para entender-se com Chatô, mas [inicialmente] o dono dos Diários Associados não sabia disso.”, disse Wainer.

Logo desenvolto na presença do presidente eleito, Chateaubriand ignorou novamente do mérito de seu jovem repórter. Mesmo trazendo “um expatriado no fim do mundo” e voltando “com ele ao poder (...) na hora de colher os frutos desse trabalho, nem mesmo merecera um aumento de salário”, disse Samuel, que nunca teve a menor simpatia por Chatô.


Assis Chateaubriand



Chateado, Wainer foi caminhar pela avenida Atlântica, ainda sem o perigo dos assaltos, arrastões, granadas e balas perdidas. 1951. Copacabana era o centro cultural, a morada dos ricos e o lugar mais visitado do Brasil pelos gringos. Ali perto, até meados da década de 40, funcionou o Cassino da Urca, de Joaquim Rolla.


***

Periclitante em seu início, o Urca tornou-se o maior cassino do Rio – desbancando os cassinos Atlântico e do Copacabana Palace, ambos na avenida Atlântica – após contratar Carmen Miranda para apresentar-se nele com seus sambas, marchinhas, sandálias-plataforma. Ali, como crooners, as cantoras Emilinha Borba e a vedete Virgínia Lane iniciaram suas carreiras.


Mas, em 1951, a realidade musical era outra. Os artistas já não tinham os cassinos para se apresentar, apenas as casas de shows e os auditórios das rádios. Nem uma cota que obrigasse empresários do ramo a reservar 50% do seu espaço aos artistas nacionais, como determinara Getúlio em 1935. Os gêneros musicais favoritos do público eram os boleros e samba-canções (versão lamuriosa do samba). Os sambas e marchinhas estavam reservados ao carnaval. Quem quisesse música mais animada, picardia e sensualidade ao longo do ano que fosse assistir às revistas musicais nos teatros da praça Tiradentes.

Era o que Getúlio fazia – mas por apreciar vedetes. A sua favorita era Virgínia Lane, a estrela da companhia Walter Pinto, a maior companhia de Teatro de Revista da história do Brasil. Getúlio chamava Virginia de “A vedete do Brasil”. Difícil saber se pelo talento dela nos palcos ou na intimidade dos dois, que mantiveram um caso atrapalhado pela barriguinha dele. “Mas tudo se resolvia na horizontal”, afirma Virginia Lane até hoje.

No Cassino da Urca, Benjamin Vargas (o Bejo), irmão mais novo de Getúlio, acompanhado de militares amigos, fumava charutos, comia e bebia de graça e dava tiros para o alto. Atitudes que não davam prejuízo algum ao cassino – ao contrário de sua nomeação a chefe de polícia do Distrito Federal, feita por Getúlio, em 1945, o beijo da morte ao já vulnerável seu Estado Novo.


Com o fim da ditadura de Vargas, Eurico Gaspar Dutra é eleito presidente da República e determina a proibição dos jogos de azar no Brasil, por conta dos vícios da primeira-dama, Eunice Gaspar Dutra em apostas. Sem as roletas, baralhos e caça-níqueis para sustentar as apresentações musicais, os cassinos são obrigados a fechar. O prédio em estilo neoclássico que abrigava o Cassino da Urca vai para as mãos de Chateaubriand, em 1950, para abrigar a primeira emissora de TV da América Latina – a Tupi – e servir como veículo de oposição a Getúlio Vargas e Samuel Wainer, através do ódio e do talento retórico de Carlos Lacerda.

É o fim da era de ouro dos cassinos no Brasil. A noite da elite carioca transfere-se definitivamente para Copacabana, onde passaram a ser tomadas decisões que mudaram a história do Brasil. Como a de Samuel.
2.





O Jornal




Na avenida Atlântica, sem os tiros e os cassinos Atlântico e do Copacabana Palace, Wainer começou a ter certeza de que deveria ter o seu próprio jornal.



Poucas semanas depois, numa conversa com Vargas, Samuel disse a ele que era (foi) possível vencer as eleições sem qualquer apoio da imprensa, mas seria impossível governar com todos os veículos em oposição. Getúlio propôs que Samuel tivesse seu próprio jornal. E o jornalista, que desde o passeio pela avenida Atlântica planejava e ansiava por isso, respondeu:



“Em 45 dias, dou um jornal ao senhor”, disse Samuel. “O Última Hora começava a nascer, e eu a encontrar minha razão de viver.”.



Segundo o jornalista Augusto Nunes, “Samuel queria um jornal, queria o poder. Queria namorar mulheres bonitas, frequentar altas rodas, calçar mocassins, tudo o que sua origem pobre e judia não poderia lhe dar. Ele era um líder, ótimo montador de jornal e coordenador do mesmo, algo que se vê muito dentro da imprensa. Por vezes, um diretor de redação pode não ter o melhor texto, mas coordena a redação como ninguém, o que era o caso de Samuel. Ele foi genial na criação do seu jornal. O Última Hora foi o jornal certo na hora certa.”




Samuel na gráfica do Última Hora


Lançado com o slogan “Um jornal a serviço do povo”, o Última Hora era um vespertino eminentemente getulista. Samuel sabia, porém, que não bastaria que o seu jornal desse apoio irrestrito ao presidente sem ser um sucesso editorial. Para atrair o grande público, procurou fazer o que os grandes jornais da época não faziam: prestou serviços aos bairros pobres e à população carente, colocou manchetes sobre futebol na primeira página (até então só jornais sobre esportes faziam isso), fazia concursos e distribuía prêmios. Além disso, aumentou o salário dos jornalistas e vendeu o jornal a preço muito baixo – o que irritou ainda mais seus concorrentes. Em seu quadro de funcionários, estiveram, dentre outros, Rubem Braga, Paulo Francis, Jorge Amado e Nelson Rodrigues, com as suas histórias da “vida como ela é”, um dos grandes sucessos do jornal a partir de meados dos anos 50.


No início da década, porém, fora a coluna “O dia do presidente”, criada por Wainer e assinada pelo jornalista Luis Costa a principal responsável pelas vendas do jornal nas bancas.


Enquanto a coluna de Nelson contava histórias do cotidiano funesto, histérico e sanguinolento do subúrbio da Zona Norte carioca, a de Luis Costa falava sobre o dia-dia do presidente da República. Em pouco tempo, tornou-se uma “instituição nacional”, conforme dissera o jornal Correio da Manhã (o jornal preferido das elites cariocas, que deixou de circular em 1974). Além de ajudar a estabelecer o Última Hora no mercado jornalístico brasileiro, a coluna obrigou a imprensa a se render à popularidade de Vargas e foi copiada por outros jornais. O vespertino de Wainer, porém, continuava sendo o único veículo aliado ao presidente. E, segundo o jornalista Augusto Nunes, “o primeiro e único jornal popular do Brasil. E sem populismo, como fazia o Notícias Populares, com a história do bebê-diabo e coisas do tipo. Era um grande jornal”.



O Última Hora traria a Samuel o poder de influência e o prestígio desejados nos tempos de garoto pobre, filho de imigrantes judeus, do Bom Retiro e de repórter desprestigiado de O Jornal de Assis Chateaubriand. Traria também todas as forças para destruir essas conquistas, lideradas por um inimigo que desejava destruí-lo há algum tempo: Carlos Lacerda.


“Quando o Última Hora nasceu, o ódio de Lacerda por mim exacerbou-se”, conta Wainer.


Carlos Lacerda


3.


O Inimigo



Carlos Lacerda era da oposição a Getúlio desde o segundo governo do presidente, iniciado em 1934. Então filiado ao PCB (Partido Comunista Brasileiro), Lacerda fora um dos fundadores da ANL (Aliança Nacional Libertadora), movimento de oposição a Getúlio fundado em 1935 numa reunião no Teatro João Caetano, palco das vedetes e revistas musicais, e abortado no mesmo ano, pelas forças militares do governo.


No início dos anos 40, Lacerda fora expulso do PCB após uma reportagem sobre a história do partido que, mal interpretada, levou à perseguição política e morte de alguns filiados.


Certo de que nunca mais voltaria ao partido, dedicou-se ao jornalismo. Em 1943, fora contratado por Wainer para trabalhar na revista Diretrizes – da qual saiu, demitido por Samuel, quando o trabalho tornou-se quase impossível, por conta da arrogância de Lacerda, que vivia em conflito com outros membros da redação.



Demitido da revista, Lacerda passou a atuar como jornalista freelancer. Em fevereiro de 1945, burlou a censura do Estado Novo e publicou, no Correio da Manhã, uma entrevista com o escritor e político José Américo de Almeida, com fortes críticas à ditadura de Vargas e um convite à manifestação popular. Fora o início da queda da queda do Estado Novo de Getúlio, consumada com a nomeação de Benjamin Vargas para o cargo de chefe de polícia do Distrito Federal.


O rancor eterno de Lacerda a Samuel veio após uma negativa do último em publicar na Diretrizes uma carta de apoio a Vargas na guerra contra as nações do Eixo, dado que isso contrariava a linha editorial da revista.


A publicação carta na Diretrizes era a última chance que Lacerda tinha de voltar ao PCB (Partido Comunista Brasileiro). Diante da negativa do editor de Diretrizes, Lacerda reagiu com agressividade. Segundo Samuel, “Ele arrancou-me a carta das mãos e dirigiu-me um olhar que jamais esqueci. Era um olhar de frustração e ódio.”.


Ressentido, tempo depois, Carlos Lacerda filou-se à UDN (partido que representava a direita mais conservadora que havia no Brasil; o extremo oposto do PCB) e, nos anos 50, encontrou seus dois maiores inimigos, Samuel Wainer e Getúlio Vargas, juntos. Tomou a si o papel de principal força opositora a Vargas, Samuel e o Última Hora.


Assim como Getúlio, Samuel tinha toda a imprensa contra si. Na falta de um veículo de sucesso para bater em seus dois oponentes, já que seu jornal, A Tribuna da Imprensa, criado com dinheiro da UDN, era um fracasso, Lacerda utilizava-se de dois outros veículos que tinha à disposição: a Rádio Globo, do jornalista Roberto Marinho, e a TV Tupi, de Chatô – o qual, apesar do encontro que tivera com Vargas, pela primeira vez, não era aliado de um presidente.



As críticas a Samuel repercutiam. Lacerda sentia-se, e dizia-se, invencível. “Enquanto andávamos pelas ruas meio vazias de Copacabana, ouvíamos, vindo das TVs dos apartamentos escuros, a voz de Lacerda dizendo horrores sobre Samuel”, conta a cronista Danuza Leão, que fora casada com Samuel Wainer, em Quase Tudo, seu livro de memórias.


Disposto a destruir o Última Hora, seu dono e Getúlio, Lacerda lançou duas acusações: a primeira de que o Última Hora havia sido montado com operações de crédito fraudulento entre o grupo empresarial montado por Samuel para fazer o jornal e o Branco do Brasil; a segunda de que Wainer era, na verdade, estrangeiro, o que o impedia, de acordo com a legislação vigente até os dias de hoje, de ser dono ou sócio majoritário de um veículo de comunicação.

Vários foram os meios utilizados por Samuel para conseguir dinheiro suficiente para montar o Última Hora:


Primeiramente, Samuel Wainer teve que desembolsar 30.000 cruzeiros, com o qual comprou a gráfica do jornal Diário Carioca (que deixou de circular após o golpe de 1964, por opor-se ao regime vigente). O dinheiro veio em três partes: 10.000 cruzeiros foram conseguidos com Walter Moreira Salles, do antigo Banco Moreira Salles, hoje Itaú Unibanco; 10.000 com Evaldo Loudi e mais 10.000 com Ricardo Jafet, presidente do Banco do Brasil na época e herdeiro do Banco Cruzeiro do Sul. Isso, porém, representava uma pequena parte dos recursos necessários para abrir o jornal.


Outra soma em dinheiro, no valor de 22.000 cruzeiros, para reformar a parte gráfica do jornal e comprar papel mais barato, fora emprestada a Wainer pelo Banco do Brasil e dera argumento para que Lacerda começasse a sustentar a ideia de que o vespertino de Wainer fora financiado pelo Banco do Brasil. Em repercussão às acusações feitas por Lacerda, os demais veículos começaram a temer que somente o Última Hora passasse a ser o único beneficiado pelo governo a partir de então – dado que o financiamento governamental à imprensa era uma praxe na época.



A maior parte do dinheiro para que o Última Hora fosse lançado, veio, porém, de “um homem que começava a crescer na cena política brasileira: Juscelino Kubistchek”, então governador de Minas Gerais. Por meio deste, Wainer conseguiu dinheiro de três bancos ligados ao governo daquele estado. “Eram, evidentemente, transações de caráter político, já que eu não tinha condições financeiras de obter tanto dinheiro daquela forma. O pagamento seria feito em publicidade”, conta Samuel.



Porém, fora o controle da falida Rádio Clube o que abalou Samuel Wainer. Para despistar seus inimigos a respeito da aquisição de comando da rádio, o dono do Última Hora transferiu as ações da rádio para o nome de Marcos Rebelo sem a autorização do governo federal (necessária, dado que o sinal de uma rádio é concessão pública, emitida pelo governo federal). Lacerda e Chateaubriand, ao saberem disso, intensificaram os ataques a Samuel, o que fez com que Getúlio, à surdina, buscasse distanciar-se do dono do Última Hora, e ordenasse que a concessão da rádio fosse tirada das mãos de Samuel. A ele, restaram apenas as dívidas da rádio, passadas para o seu grupo, que incluía o Última Hora do Rio e suas sucursais. Samuel, que freqüentava o Palácio do Catete (sede do governo), sem anunciar-se, viu-se desprestigiado pelo presidente.



“Ficou evidente que eu já não era o delfim de Getúlio. (...) se fosse necessário, Getúlio não hesitaria em sacrificar-me. Decidi que chegara a hora de fortalecer minha empresa e prepará-la para a eventualidade de ter de sobreviver sem a mão amiga de Vargas”, diz Wainer em Minha Razão de Viver.


Samuel não contava com a traição de Getúlio. “A relação dele com Getúlio foi diferente de todas as outras que Getúlio tinha. Eles eram cúmplices. Mesmo traído e abandonado por ele, Samuel nunca lhe guardou ódio, ainda que tivesse motivos. Seus elogios a ele, no livro, são totalmente sinceros”, afirma Augusto Nunes.


Apesar da traição de Getúlio, Wainer acreditava que derrotaria Lacerda e Chatô. E cometeu mais um erro. Para a alegria de seus dois inimigos, Samuel estimulou a criação de uma comissão parlamentar de inquérito (CPI) para investigar o Última Hora, um grande erro. Só com a CPI instalada é que ele percebeu quão frágil era a base governista e quão disposta ela estava a trair Getúlio Vargas, o verdadeiro foco da CPI e da perseguição a Wainer.

Em 12 de julho de 1953, o Diário de São Paulo publica em sua capa:


“Wainer não nasceu no Brasil”



Lacerda e Chateaubriand tiveram acesso a um documento retirado do Colégio Pedro II, em São Paulo, onde Wainer havia estudado. No documento, Arthur, irmão mais velho de Samuel, afirmava que esse havia nascido na Bessarábia e chegara ao Brasil com dois anos de idade. Para provar o contrário, Samuel e o irmão contaram com o depoimento de moradores do Bom Retiro, que o conheceram ainda bebê e afirmaram ter assistido à sua circuncisão, o que comprovaria a sua nacionalidade brasileira (já que a circuncisão é feita em recém-nascidos).

Temendo os danos que seu jornal viesse a sofrer, ainda em 1953, Wainer sugeriu a Getúlio o fim do Última Hora, por meio de um jogo político, ou que a dívida do grupo que detinha o jornal fosse executada pelo Banco do Brasil. Mas Getúlio demonstrou indisposição para cuidar do assunto. Quando Wainer deixou o Catete, sede do governo federal da época, “pressentindo que não voltaria a pisar” ali “até o final do governo de Getúlio”, este ordenou que a dívida fosse executada pelo Banco do Brasil. Wainer pediu que os demais jornais sofressem o mesmo. “Mas só a do Última Hora foi efetivamente executada”. E paga.


Samuel acabou absolvido na CPI sobre a origem do dinheiro que montou o Última Hora. Não por ser inocente. “O Última Hora recebeu dinheiro do Banco do Brasil, sim. Mas os outros veículos da época fizeram isso também. O que houve com o Samuel, para a abertura do Última Hora, era um retrato do que acontecia na época e por isso ele acabou absolvido no processo. Lembra bem o discurso do presidente Lula, há pouco tempo [abril de 2009], sobre as passagens aéreas [quando o presidente acusou a imprensa de perseguir o Legislativo e disse que era hipocrisia acusar a Câmara pelo uso indiscriminado de passagens aéreas, já que isso sempre fora feito].”, diz Augusto Nunes. Foi preso em primeira instância por falsidade ideológica – ao afirmar ser brasileiro –, mas solto tempo depois.


Getúlio e Samuel passaram a se falar apenas por meio de intermediários. Não havia mais espaço para intimidade entre eles. Mas os leitores do Última Hora jamais souberam disso. Em suas memórias, Wainer conta que “O jornal continuou fiel à linha editorial que sempre o orientou. (...) a figura de Getúlio deveria ser poupada de qualquer jeito”.

Gregório Fortunato, o chefe da segurança de Getúlio Vargas, com quem o presidente pouco simpatizava, teve uma ideia para solucionar os problemas enfrentados pelo seu governo: matar Carlos Lacerda. E ordenou que o fizessem – sem dizer nada a Getúlio.


No dia 5 de agosto de 1954, Lacerda e um major da Aeronáutica, são baleados na rua Toneleros (hoje chamada apenas de Tonelero, como se queixa Paulo Francis, em seu livro “O afeto que se encerra”, de 1980), em Copacabana. O telefone toca na casa de Samuel. É um repórter da Última Hora com más notícias para seu chefe: Lacerda havia sofrido um ataque e sobrevivera. Ao saber disso, Samuel deu um soco na mesa do telefone e disse, “merda”, como conta Danuza Leão em suas memórias.


“Lacerda soube utilizar-se teatralmente do episódio. (...) transformou seu quarto de hospital em centro de conspirações e comandou os desdobramentos da crise que levaria ao suicídio de Getúlio Vargas”, conta Samuel. Para começar, acusou Getúlio de ser o mandante do atentado. “Criou a então chamada ‘República do Galeão’, que passou a funcionar como uma delegacia paralela. As investigações apuraram que o mandante fora o chefe da segurança de Vargas, Gregório Fortunato”, relata Danuza em seu livro. A situação de Getúlio ficou insustentável. As forças armadas rebelaram-se de vez contra o presidente, exigindo sua renúncia.


Mesmo com Samuel distante do presidente, o Última Hora fez o que pôde para preservar a sua imagem e desvinculá-las das acusações feitas por Carlos Lacerda. E publicou no dia 23 de agosto de 1954, como manchete de capa a incitação de Getúlio ao confronto:



“Getúlio ao povo: só morto sairei do Catete”



Getúlio iria convocar o ministério para informar sobre sua renúncia. Mas o ódio a ele não esgotaria com ela. Benjamin Vargas seria, novamente, o que selaria a crise no governo do irmão.


Bejo havia sido chamado para depor na República do Galeão. E, abatido, sem a empáfia e truculência que caracterizavam seu comportamento nos tempos do Estado Novo, avisou Getúlio que ele seria o próximo. “Para um homem de 71 anos, tratava-se de uma humilhação insuportável.”, disse Samuel Wainer. Sem dizer nada ao irmão e melhor amigo, Getúlio, naquele momento, tomou a decisão mais inteligente da história política do Brasil.

Vestido num pijama de seda com listras de cor cinza, branca e carmim e mangas cumpridas, Getúlio, com a mão no bolso, passou pela filha Alzira e foi para o seu quarto, no último dos três andares do Palácio do Catete.
Relatou em carta sua decisão:

“Mais uma vez, as forças e os interesses contra o povo coordenaram-se novamente e se desencadeiam sobre mim.
“Não me acusam, insultam; não me combatem, caluniam e não me dão o direito de defesa. Precisam sufocar a minha voz e impedir a minha ação, para que eu não continue a defender, como sempre defendi, o povo e principalmente os humildes. Sigo o destino que me é imposto. Depois de decênios de domínio e espoliação dos grupos econômicos e financeiros internacionais, fiz-me chefe de uma revolução e venci. Iniciei o trabalho de libertação e instaurei o regime de liberdade social. Tive de renunciar. Voltei ao Governo nos braços do povo. A campanha subterrânea dos grupos internacionais aliou-se à dos grupos nacionais revoltados contra o regime de garantia do trabalho. A lei de lucros extraordinários foi detida no Congresso. Contra a justiça da revisão do salário mínimo se desencadearam os ódios. Quis criar a liberdade nacional na potencialização das nossas riquezas através da Petrobrás, mal começa esta a funcionar, a onda de agitação se avoluma. A Eletrobrás foi obstaculizada até o desespero. Não querem que o trabalhador seja livre. Não querem que o povo seja independente.
“Assumi o Governo dentro da espiral inflacionária que destruía os valores de trabalho. Os lucros das empresas estrangeiras alcançaram até 500% ao ano. Na declaração de valores do que importávamos existiam fraudes constatadas de mais de 100 milhões de dólares por ano. Veio a crise do café, valorizou-se o nosso principal produto. Tentamos defender seu preço e a resposta foi uma violenta pressão sobre a nossa economia a ponto de sermos obrigados a ceder.
“Tenho lutado mês a mês, dia a dia, hora a hora, resistindo a uma pressão constante, incessante, tudo suportando em silêncio, tudo esquecendo a mim mesmo, para defender o povo que agora se queda desamparado. Nada mais vos posso dar a não ser meu sangue. Se as aves de rapina querem o sangue de alguém, querem continuar sugando o povo brasileiro, eu ofereço em holocausto a minha vida. Escolho este meio de estar sempre convosco. Quando vos humilharem, sentireis minha alma sofrendo ao vosso lado. Quando a fome bater à vossa porta, sentireis em vosso peito a energia para a luta por vós e vossos filhos. Quando vos vilipendiarem, sentireis no meu pensamento a força para a reação. Meu sacrifício vos manterá unidos e meu nome será a vossa bandeira de luta. Cada gota de meu sangue será uma chama imortal na vossa consciência e manterá a vibração sagrada para a resistência. Ao ódio respondo com o perdão. E aos que pensam que me derrotaram respondo com a minha vitória. Era escravo do povo e hoje me liberto para a vida eterna. Mas esse povo de quem fui escravo não mais será escravo de ninguém. Meu sacrifício ficará para sempre em sua alma e meu sangue será o preço do seu resgate.
“Lutei contra a espoliação do Brasil. Lutei contra a espoliação do povo. Tenho lutado de peito aberto. O ódio, as infâmias, a calúnia não abateram meu ânimo. Eu vos dei a minha vida. Agora ofereço a minha morte. Nada receio. Serenamente dou o primeiro passo no caminho da Eternidade e saio da vida para entrar na História.”


Em seguida, posicionou no bolso do pijama, no lado direito do peito, a arma que acariciava no bolso quando passou pela filha, e atirou, encerrando sua vida.

A capa do Última Hora no dia 24 de agosto de 1954 foi:





Edição extra do Última Hora com a carta de suicídio de Getúlio.



O jornalista Augusto Nunes, assim como muitos historiadores, considera que “O suicídio foi o gesto político mais inteligente da história do Brasil. Preparou o terreno para [Getúlio fazer] seu sucessor, JK, e adiou o golpe militar de Estado em dez anos.”.




A arma com que Getúlio Vargas se matou (Fonte:http://www.cpdoc.fgv.br/nav_fatos_imagens/fotos/GetulioVargas/revol.jpg)



4.


Projeção histórica


Em 1964, os militares, sob a bandeira anticomunista e com o apoio da burguesia, depuseram o presidente João Goulart (vice de JK e de seu sucessor, Jânio Quadros, que renunciou à presidência) e tomaram o poder, como um regime de exceção, sob o pretexto de restabelecer a ordem no Brasil. Em 13 de dezembro de 1968, o regime de exceção, então presidido pelo general Arthur da Costa e Silva, legitimou-se como uma ditadura ao instituir o AI-5, que, dentre outras coisas, dissolveu o Congresso e colocou a imprensa sob censura prévia.



Samuel Wainer

Grupos e figuras de oposição passam a ser perseguidos e torturados, produtos artísticos e ideias proibidos de circular, comunistas aderem à guerrilha para derrubar os militares e instaurar uma ditadura de esquerda. Milhares de brasileiros deixam o país – por imposição do governo militar ou por conta própria. Samuel, com a Guanabara (estado-capital criado após a inauguração de Brasília, correspondente, hoje, à cidade do Rio de Janeiro) governada por Carlos Lacerda e o Brasil por seus aliados, fora um deles – e vivera anos muito difíceis.
Última Hora. 14/12/1968.

Já separado de Danuza Leão – que se apaixonou por Antonio Maria, cronista de Última Hora, e pediu o divórcio – Samuel fora para a embaixada no Chile e, em seguida, para Paris. Divide 2/3 de suas ações do Última Hora (tanto o do Rio quanto de sucursais) entre Baby Bocaiúva, um dos sócios do jornal, e seu advogado. É traído pelos dois, que se unem e coagem Samuel a vender o 1/3 que lhe resta das ações do vespertino ou comprar as ações que havia transferidos aos dois. Para não perder o jornal que já não tinha valor algum diante do mercado editorial brasileiro, Samuel abriu mão do que ainda restava do seu patrimônio.


Nessa mesma época, a amizade com Juscelino também é desfeita. Rico e exilado após o golpe militar, JK uniu-se a Lacerda, antigo aliado e, então, novo inimigo dos militares brasileiros (por não ter sido aceito como sucessor de Castelo Branco, o primeiro presidente do regime), contra o governo militar. Segundo o próprio Juscelino, isso era necessário para a democracia do país.


Para Samuel, a relação entre os dois ex-inimigos era algo inaceitável, o que levou a afastar-se de JK.


Após uma carreira fracassada como produtor de cinema e o convívio com grandes figuras das artes e intelectualidade européias dos anos 60, Samuel volta ao Brasil em 1968. “Quando deu de cara com a paisagem deslumbrante da Lagoa, ele caiu em pranto”, conta Danuza Leão.


Logo, mudou-se para São Paulo. Trabalhou em diferentes redações, inclusive a do Última Hora paulista, quando esta já tinha outro proprietário.


Em 1977, após ter vendido o que ainda detinha do Última Hora, Wainer tornou-se conselheiro editorial e colunista da página 2 da Folha de São Paulo, onde esteve até morrer, dia 2 de setembro de 1980, aos 68 anos. Não houve inventário de bens. Como herança material, Samuel deixou apenas um aparelho de telefone. Como legado histórico, deixou 53 fitas onde contava a sua história, que pretendia transformar em um livro de memórias, chamado Por uma Razão de Viver. Mas não teve tempo para isso. Quem, então, decidiu transformá-las em livro foi sua filha, Pink Wainer. O jornalista Augusto Nunes, que escreveu o livro de memórias de Samuel, conta que “Pink procurava alguém para transcrever as fitas deixadas por seu pai e me pediu uma indicação. Ao ouví-las, tomei a mim o projeto de transcrevê-las e editá-las. Ao todo, transcritas, as gravações davam mais de 1.300 laudas. Como o próprio Samuel pretendia transformá-las em livros, a ordem dos eventos era completamente desordenada. Tanto que, ao fazer o livro, eu tive que checar informações, confirmar datas que se confundiam. A Pink não sabe, mas, no meio das gravações havia ainda duas laudas datilografas pelo Samuel Wainer. Começavam com algo do tipo ‘Eu devo a minha história a duas pessoas: Getúlio Vargas e Carlos Lacerda’. Não era um bom começo para o livro. Ao escrevê-lo, eu me preocupei em dar uma ordem narrativa, próxima a do roteiro cinematográfico, para torná-la mais envolvente.”. Além disso, o livro “tinha que ser em primeira pessoa, já que era feito a partir do depoimento de Samuel. Ouvi várias vezes as gravações, li e reli seus textos, para captar a sua maneira de falar e transpor para o livro o mais fiel possível à sua voz. Tive que reescrever tudo e organizar o material. Os diálogos, por sua vez, foram mantidos à exatidão do que estavam na fita. Compactei vários episódios e excluí outros; Preferi focar em grandes conflitos e relações como a dele com Carlos Lacerda. Esse material que não foi utilizado existe até hoje”.


Minha Razão de Viver, o título definitivo do livro, escolhido por ser mais sonoro que o anterior, foi publicado pela primeira vez em 1987. Para Augusto Nunes, o livro “foi, de fato, a primeira biografia brasileira. Nas outras, todos os biografados eram príncipes, sem falhas, sem erros. O Carlos Lacerda, em sua autobiografia, é um exemplo disso. Por sua honestidade, o livro causou bastante impacto na época. E fez escola. Depois dela, é que surgiram outros biógrafos, como o Ruy Castro, com “A Estrela Solitária” [biografia do jogador Garrincha], “O Anjo Pornográfico” [biografia de Nelson Rodrigues].”.


É mesmo uma biografia muito honesta. Nela, Wainer deixou de contar apenas a verdade sobre a sua nacionalidade, por conta das pessoas que lhe foram solidárias e mentiram no processo sobre o assunto. Ele pretendia que a verdade a esse respeito fosse revelada apenas 25 anos após a sua morte. Lacerda tinha razão em chamá-lo de bessarabiano. A Bessarábia, um país do leste europeu, era sua terra natal. Os arquivos do colégio Pedro II e o depoimento do irmão de Samuel eram verdadeiros.


Lacerda tinha também os seus apelidos. Wainer, e boa parte do Rio de Janeiro, inicialmente o chamavam de Corvo. Em seguida, passou a ser chamado de “Mata-Mendigos” (alcunha criada por Paulo Francis), por conta de sua ligação nos assassinatos de mendigos no Rio de Janeiro.


Amado Ribeiro, repórter do Última Hora (utilizado por Nelson Rodrigues em O Beijo no Asfalto, como exemplo de repórter inescrupuloso, o que muito o envaideceu), revelou imagens que ligavam Lacerda ao crime, impedindo-o de suceder Castelo Branco na presidência da República durante o regime militar.


Samuel e Lacerda se viram pela última vez em 13 de outubro de 1955, na fase final do processo sobre a nacionalidade do primeiro. Conforme o próprio Samuel conta no livro, “Ele [Lacerda] estava lívido, em momento algum olhou-me nos olhos. Eu, ao contrário, fiquei a observá-lo o tempo todo, contemplando o perfil do homem que na mocidade fora meu amigo e agora tentava destruir-me”. Neste processo, Wainer acabou condenado a um ano de prisão. O depoimento de seu irmão e dos antigos vizinhos do Bom Retiro, não foram o suficiente para inocentá-lo em 1ª instância. Foi absolvido, e liberto da cadeia, apenas em última instância, pelo Superior Tribunal Federal.


Lacerda foi a única pessoa de quem Wainer guardou rancor – tanto que nao conseguiu acreditar que era verdade a notícia de sua morte, em 21 de maio de 1977. Mas era.


Apesar do ressentimento, Samuel não renegava a importância de Lacerda para a sua projeção histórica. Considerava-o um dos três fatores que o levaram a ela. As outras duas: a entrevista com Getúlio Vargas, que o trouxe de volta ao poder, “nos braços do povo” e da criação de “um jornal tão revolucionário que sobreviveria a campanhas de extermínio e crises de todos os tipos”, o Última Hora. (Lacerda, aliás, carece de uma biografia honesta, afirma o jornalista e escritor Ruy Castro. “Mas eu não fazê-la”, disse. “A família do Lacerda já era ligada à política. Este é o trabalho de, no mínimo, cinco anos de pesquisa. E eu não quero passar cinco anos casado com o Lacerda”.).


Além do aparelho telefônico e das fitas, Samuel Wainer deixou a vontade de viver mais uma aventura dentro da imprensa: a criação de um jornal em São Bernardo do Campo, o epicentro do movimento sindical do final dos anos 70. Com o jornal, ele pretendia tocar na modernização do operariado brasileiro da época e iniciaria uma nova aventura, sua, afinal, grande razão de viver. Dificilmente, porém, este jornal seria mais significativo na biografia de Wainer que o anterior. “O Última Hora, com tudo o que ele representava, foi o seu grande momento e a sua grande paixão. Acima de qualquer coisa, do próprio jornalismo.”, diz Augusto Nunes.


No dia 3/09/80, o jornalista Samuca, segundo filho de Samuel, publica um texto na primeira página do Jornal do Brasil intitulado “Samuel Wainer, meu pai”.


Agora, o filho caçula de Samuel, Bruno Wainer, pretende adaptar Minha Razão de Viver para o cinema. “Eu disse ao Bruno que, por conta do trabalho de edição do livro, devo fazer o roteiro.”, diz Augusto Nunes, autor das memórias de Samuel.



Danilo Thomaz

Bibliografia:

Livros:
NUNES, Augusto. Minha Razão de Viver – Memórias de um Repórter. Editora Planeta. 2003.
LEÃO, Danuza. Quase Tudo. Companhia das Letras. Rio de Janeiro. 2005.
FRANCIS, Paulo. O Afeto que se Encerra. Editora Francis. 2005.
CASTRO, Ruy. Carmen – uma biografia. Companhia das Letras. 2005.
CASTRO, Ruy. O Leitor Apaixonado (“Vida e Morte do Correio da Manhã”). Companhia das Letras. 2009.
CASTRO, Ruy. O Anjo Pornográfico (biografia de Nelson Rodrigues). Companhia das Letras. 1992.


Internet:
CPDOC/ FGV – Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do Brasil da Fundação Getúlio Vargas: http://cpdoc.fgv.br/
Almanaque Folha de São Paulo: http://almanaque.folha.uol.com.br





***


Com este post, o METAJORNALISMO despede-se de seus leitores. Esperamos ter prestado um bom serviço a vocês, explorando fatos pouco conhecidos sobre o jornalismo, trazendo fatos novos e auxiliando-lhes a ter um posicionamento mais crítico com relação à imprensa. Obrigado pelos acessos e comentários.



Danilo Thomaz

Editor-chefe

quinta-feira, 4 de junho de 2009

podcast METAJORNALISMO

O programa de rádio que estava faltando ao METAJORNALISMO - e à imprensa. Um espaço radiofônico onde as questões do jornalismo de ontem, hoje e de um provável amanhã são discutidas em meio à canções, aplausos, gritos, solenidades e intervenções técnicas. Além do quadro que irá para a CPI: "O que deve ir para a Petrobrás?" e "O que deve ficar bem longe da Petrobrás?" - dentro do jornalismo, claro. Ouçam e comentem. Por que comentar? Ouçam e saberão.


http://www.4shared.com/file/108356862/2d29cf24/PODCAST.html



Créditos:

Yasmin Gomes - mediadora e debatedora
Danilo Thomaz - redator e debatedor
Catharina Guadalupe - debatedora
Lilian Sanches - debatedora

segunda-feira, 1 de junho de 2009

Um pouco da história dos pasquins.

Pasquim: Jornal ou panfleto difamador. (dicionário Michaelis)



Muitas características marcaram os jornais durante a história da imprensa brasileira.
Havia jornais que eram tradicionais, com linguagem culta e sem extravagância, mas havia também pequenos jornais de nomes estranhos, de caráter humorístico, que levantavam grandes discussões principalmente em épocas de censura.

Por volta de outubro de 1822, a liberdade de imprensa volta a ser restringida. E a partir desta censura surgem os pasquins, que eram pequenos jornais-panfletos de vida efêmera que defendiam ideais de liberdade e luta, nos quais o Brasil viveu desde os tempos de Regência até a República. Possuíam linguagem violenta, que criticavam e denunciavam os males do governo da época, recorriam também à calúnia e ao insulto pessoal, tudo isto de forma cômica e descontraída para atrair e desenvolver o espírito crítico nos brasileiros.

A Regência foi marcada pelo período das Sociedades Políticas, e estas difundiam suas idéias por meio de jornais e pasquins. Por exemplo, a Sociedade Defensora da Liberdade e da Imprensa, que era integrada por membros do grupo Moderado, contava com os pasquins Aurora Fluminense, Astréia e O Sete de Abril; A Sociedade Federal que era composta pelos Exaltados, disseminavam suas idéias nos pasquins A Malagueta, Republico, O Grito dos Oprimidos e o Burro Aflito; E por fim a Sociedade Conservadora da Constituição Brasileira, que mais tarde de chamou Sociedade Militar, constituída pelos Restauradores, chefiados por José Bonifácio de Andrada e Silva (na foto acima), que dispunham dos pasquins O Brasil Aflito, O Soldado Aflito, O Tamoio Constitucional e O Caramuru.

Após o período regencial, os pasquins passariam a ter uma paixão doutrinária, passando a defender princípios abolicionistas e Republicanos.


O jornal O Pasquim.





Por volta de 1969, época do regime militar, com a mesma idéia satírica e politizada com críticas ao governo, surge O Pasquim, criado pelo cartunista Jaguar e pelos jornalistas Tarso de Castro e Sérgio Cabral, sendo o jornal mais influente de oposição à ditadura no Brasil, atingindo uma tiragem de 200 mil exemplares em meados dos anos 1970. O símbolo principal do jornal era o ratinho Sig (de Sigmund Freud), desenhado por Jaguar, que dizia : “...se Deus havia criado o sexo, Freud criou a sacanagem”.

Grandes figuras de destaque na imprensa participaram do jornal, como Ziraldo, Millôr Fernandes, Henfil, Prósperi, Claudius, Fortuna, Miguel Paiva, Hubert, Reinaldo e muitos outros.

Algumas charges da época:

Henfil









































Por falar sobre política e cultura de forma humorística, O Pasquim passou a atrair grande público, mas por ser um jornal de esquerda, desagradou o governo. Em 1970, a redação inteira foi presa por causa da publicação de uma sátira do quadro de Dom Pedro I as margens do Ipiranga. Com isso, os militares acharam que o jornal sairia de circulação, porém Millôr Fernandes, que escapara da prisão, conseguiu manter O Pasquim com o apoio de intelectuais cariocas. Mas com tantas ameaças mais as baixas publicações, o jornal estava próximo do fim, mas ainda sobreviveria a redemocratização de 1985.

Com o surgimento de jornais oposicionistas e novos conceitos de humor, O Pasquim chegou ao fim, tendo sua última edição em 1991, apesar dos esforços de Jaguar em manter o jornal ativo.

Isso não significou que O Pasquim tenha caído no esquecimento, o jornal ganhou um documentário produzido com recursos do governo chamado O Pasquim – A Subversão do Humor, que foi lançado em junho de 2004 e exibido pela TV Câmara. Em 2006 a Editora Desiderata lançou o livro O Pasquim – Antologia. 1969-1971, tendo um segundo volume em 2007, que cobre o período entre 1972 e 1973.


O documentário sobre o jornal O Pasquim, exibido pela TV Câmara. Para assistí-lo, clique no link abaixo:

http://www.camara.gov.br/internet/tvcamara/default.asp?selecao=MAT&Materia=17536




Ingrid Navarro

Fontes das fotos:

http://www.colegiosaofrancisco.com.br/alfa/jose-bonifacio/imagens/jose-bonifacio-8.jpg
http://spectrum.weblog.com.pt/arquivo/pasquim.jpg
http://www.universohq.com/cinema/images/henfil_profissao_cartunista2.jpg
https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEj_b4OphGQIoombxzuhMNH3Z3itaVSaLgemyQsaAixquo_tOjdMbJL99aM-Br40N6NtaMOIvTkcjRXQLnlGpIGIwme4k9bO3Wy3bLFnH0TLR_6PnlPqdM9xWbNkdB6qUDL6IcAyA3r19GkW/s400/000g3003.jpg
http://www.jblog.com.br/media/101/20080917-theotonio.jpg

terça-feira, 19 de maio de 2009

ERRATA

Ao contrário do que foi publicado no dia 12 de maio de 2009, o jornalista Augusto Nunes trabalhou como redator-chefe e não como diretor de redação da revista VEJA. O erro já foi corrigido no próprio texto.

Peço desculpas.

Obrigado,

Danilo Thomaz
Editor-chefe

segunda-feira, 18 de maio de 2009

Uma Breve História da Nona Arte











A disputa por leitores é um fato conhecido por todos que se envolvem com os jornais, e, muitas vezes, essa vontade de aumentar as vendas faz com que as pessoas sejam presenteadas com algumas inovações. Nesse cenário, foram criadas as histórias em quadrinhos, também conhecidas como a "nona arte". Apesar de hoje algumas pessoas não os levarem a sério, os quadrinhos foram responsáveis por um enorme aumento nas tiragens do final do século XIX.


Os primeiros quadrinhos que deram cor às páginas dos jornais eram feitos a partir de personagens cômicos (crianças travessas, animais ou adultos estranhos). Foi ai que apareceu a expressão americana "comics". Oficialmente, o personagem pioneiro foi "the Yellow Kid" (na imagem logo abaixo). Criado em 1845, por Richard Outcault, o menino amarelo nada mais era do que uma charge com os textos escritos em suas roupas.



Por muitos anos os "comics" dominaram as publicações, mas com a quebra da bolsa e a grande depressão que assolava os E.U.A foram criados os personagens heróicos. O povo precisava de esperança e a encontraram em desenhos realistas de heróis que enfrentavam as dificuldades e venciam no final da história. Nessa época, onde as caricaturas eram deixadas de lado, surgiu o detetive Dick Tracy e o gênero policial encheu os quadrinhos de brutalidade.

No final da década de 30, Adolfo Aizen foi o responsável por editar um suplemento infantil no jornal "A Nação", que trazia compilações das "comics" americanas. Mais tarde, o jornal "O Globo" também lançou seu suplemento voltado para o público jovem e lançou a revista "O Gibi", que popularizou e rebatizou os quadrinhos no Brasil.

Nos anos 40, com a ameaça da II guerra mundial, os heróis passaram a ter poderes extraordinários e se transformaram em super-heróis. O primeiro a nascer com esse título foi o "Superman", seguido de centenas de outros justiceiros poderosos. Em 1941 foi criado o "Capitão América" com o objetivo de incentivar a juventude americana a lutar na guerra. Neste mesmo ano, os quadrinhos deram um salto qualitativo com a criação da obra-prima de Will Eisner, "The Spirit", que fazia uso primordioso de luz e sombra, se inspirava em técnicas expressionistas e tinha histórias que pareciam retiradas de contos literários.
Alguns anos depois do final da guerra, as histórias de terror cairam no gosto dos jovens. Publicações como "Contos da Cripta" dividiam opiniões. A sociedade conservadora, alegado a preservação da moral e dos bons costumes passou a perseguir e discriminar esse tipo de quadrinhos, fazendo com que fosse criado um código de ética como o que já existia no cinema. Apesar da perseguição da sociedade, essa época foi marcada pela criação de histórias adultas com personagens infantis vivendo em um mundo cheio de neuroses e inseguranças, como o americano "Peanuts", conhecido no Brasil como Charlie Brown, e a argentina "Mafalda".

Ainda na década de 50, aparece no Brasil o que iria se tornar o maior exemplo de sucesso nos quadrinhos nacionais: a "Turma da Mônica", criada por mauricio de Souza, que completa cinquenta anos agora, em 2009. As primeiras histórias seguiam o estilo de histórias com contéudo adulto e introspectivo, com o cachorro "Bidu" falando monólogos existencias com sua companheira "Dona Pedra". A personagem que se tornou protagonistas das histórias de Mauricio só foi aparecer pela primeira vez em 1963. Mônica foi inspirada na filha do cartunista e sua criação fez as histórias seguirem por outro caminho, visando agradar o público infantil.

Com o surgimento da contra-cultura, os quadrinhos passaram a adotar uma postura mais politicamente incorreta, abusando do sexo, drogas e rock'n'roll e se tornando parte do movimento underground. Personagens com "Fritz, The Cat" mostravam o lado feio da sociedade personificada em animais e rompia com a visão de que histórias de bichinhos são bobas e infantis. No Brasil, os quadrinhos "underground" ganharam muita força na década de 80 com a revista "Chiclete com Banana". Alguns de seus colaboradores, como Angeli, Laerte e Glauco, ainda estão na ativa publicando seus trabalhos em grandes jornais do pais, e influenciando muitos artistas da nova geração.



No quadrinho acima, a tira de Angeli. À direita, no início da matéria, capa da revista em quadrinhos "The Return of Autumn Mews", publicada em 1949.



Gustavo Chiodetto

quinta-feira, 14 de maio de 2009





“Os jornais, contudo, morrerão, sinto dizer-lhes isso. Tal como existem hoje, tudo indica que morrerão. Só não me arrisco a dizer quando.
Que viva, pois, o jornalismo! (...) ”


Ricardo Noblat em “A arte de fazer um jornal diário”.





















Nota: O A.I.5 (Ato Inconstitucional número 5) instaurou a censura prévia no Brasil durante a ditadura militar.
Yasmin Gomes


terça-feira, 12 de maio de 2009

“A mudança do jornalismo, da política, da história do Brasil está na internet”


“Eu gosto de olhar para o futuro”. Foi assim que o jornalista Augusto Nunes definiu sua entrada na internet, mídia que o tem interessado muito. “A internet é a nova rua. Quero fazer parte dela”.

Seu ingresso na internet se dá no portal de VEJA, onde escreve uma coluna que leva o seu nome (http://www.veja.com.br/augustonunes). Nela, o jornalista analisa os fatos da política, resgata histórias do Brasil e trata com humor refinado frases e figuras do Brasil contemporâneo. Mas não pretende restringir-se à política. “Com o tempo pretendo diversificar a coluna, tratar de outros assuntos que me interessam”.

Augusto Nunes, que foi redator-chefe de VEJA, iniciou a carreira jornalística como revisor do extinto Diário da Noite, dos Diários Associados, conglomerado de mídia de Assis Chateaubriand. Dirigiu a revista ÉPOCA, além dos jornais O Estado de São Paulo e Zero Hora.

Como escritor, Augusto Nunes escreveu, entre outros, os livros “Minha Razão de Viver”, biografia do jornalista Samuel Wainer, e “Esperança Estilhaçada”, seu ponto-de-vista sobre o caso do mensalão. No momento, prepara a biografia do presidente Jânio Quadros.
Em entrevista concedida ao METAJORNALISMO, o jornalista fala da criação de sua coluna no portal VEJA, de suas expectativas com a internet e sobre políticos brasileiros.

***
Como veio o convite para voltar à VEJA?

Augusto Nunes
- Fui me interessando pela internet e queria fazer algo novo, dentro dela. E buscava uma empresa estável dentro do meio, como a Abril. Liguei para o Eurípedes Alcântara, meu amigo, editor de VEJA, dizendo que queria voltar. Mas não como redator-chefe nem diretor de redação, porque isso eu já ocupei esse tipo de função. Queria fazer algo dentro da internet.

O que mudou na revista ao longo desses 22 anos em que você esteve ausente dela?

Augusto Nunes
- A redação de VEJA, hoje, é mais silenciosa, como todas as outras. Algumas pessoas do meio criticam o fato, mas isso é fruto de inovações tecnológicas. Nos anos 80, quando trabalhei lá, nós não tínhamos ramal, e-mail, nada do tipo, para se comunicar internamente.
Por outro lado, não só a de VEJA, mas as redações em geral teem sofrido de um grande mal comum: que é o de ficar dentro das redações, entrevistar por telefone, e-mail. Eu não gosto disso. Eu gosto de entrevistar e ser entrevistado cara a cara, olhar nos olhos, porque eles não mentem. Quero ver o olhar, pois, como diria Tom Jobim, “Nem Marlon Brando me engana no olhar”.

Como foi a concepção da coluna?

Augusto Nunes
- Queria algo parecido com a minha coluna Sete Dias, do Jornal do Brasil, que eu gostava muito de fazer. Mas queria também algo diversificado. Então, fui criando várias sessões, algumas baseadas em coisas que eu já havia feito no passado. O “Baú de Presidentes”, por exemplo, conta algumas curiosidades e fatos desconhecidos sobre os presidentes brasileiros. Tive contato com vários deles, conheci o lado humano – e cômico – dessas figuras. O Brasil só teve presidentes loucos.

O Jânio Quadros foi um dos que conheci. Ele estava bêbado quando o entrevistei para a VEJA, no início dos anos 80. Ele e eu – o que revelei há pouco tempo. Mas ele bebeu muito mais do que eu – e ficou menos bêbado Estou escrevendo sua biografia, um projeto que já tem dez anos e estará pronto em 2010.

Todos eram loucos? Inclusive o FHC?

Augusto Nunes
- O FHC também. O fato de ele ter entrado para a política aos 48 anos, após uma vida acadêmica, como sociólogo, é uma prova disso. Ele tem pinta de imperador, de descendente da família real, nasceu para governar. De todos, porém, é o mais equilibrado. Além de ser um homem erudito, interessado por cultura. Ao contrário do presidente Lula, que não frequenta teatros nem nada e teve trinta anos para se instruir e não o fez.

Diante do desprezo do presidente Lula pela cultura e pelo conhecimento, como se justifica a defesa que muitos acadêmicos, que a elite intelectual, faz dele?
Augusto Nunes - Isso é uma hipocrisia da parte deles. Por deterem o conhecimento, ao defenderem um presidente que não se importa com isso, agem com o elitismo que tanto criticam. Mostram-se desinteressados pela disseminação da cultura e da educação.

Como foi a entrevista com o deputado Fernando Gabeira para a sua coluna? Não acha que o fato de ter utilizado a cota de passagens aéreas do Congresso com a filha prejudica a imagem dele?
Augusto Nunes - Gostei muito da entrevista com o Gabeira. Sua imagem não mudará com isso. Ele errou, mas reconheceu o que fez e se desculpou. E é como ele mesmo disse “O político ético erra, admite e segue em frente”. É isso mesmo.

De que maneira a internet tem te surpreendido?

Augusto Nunes - Pela instantaneidade. Você publica um texto e minutos depois já tem a resposta dele. E a repercussão da coluna também. Nos três primeiros dias, tivemos cerca de 30.000 acessos. É um bom sinal.

O que você espera com a coluna?

Augusto Nunes - Com o tempo, a coluna irá se diversificar. Não vou falar apenas de política, mesmo porque eu não sou um jornalista político. Acabei lidando com política por conta dos cargos que ocupei nas redações e da convivência com figuras do meio político. E escolhi esse tema para a coluna ter mais visibilidade em seu começo.

Quero também falar de cinema, futebol, que são coisas que eu gosto. Acredito muito no poder da internet. A internet é a nova rua. A mudança do jornalismo, da política, da história do Brasil está nela. Um exemplo disso foi a campanha do Barack Obama, nos Estados Unidos, que se utilizou da internet para receber doações e fazer divulgações, e a do deputado Fernando Gabeira, em sua campanha para prefeito do Rio de Janeiro. Nela, o Gabeira usou muito da internet. Ele é um homem inteligente, moderno desde 1994 mantém um site e, há alguns anos, um blog. Eu quero fazer parte disso.


Danilo Thomaz
Foto: Portal da Imprensa.

quarta-feira, 6 de maio de 2009

Edgar Leuenroth e a A Plebe brasileira


Na década de 1910, com a já instaurada Republica Velha, o Brasil passava por problemas sociais, principalmente com o alto custo de vida, que se agravou com a Primeira Guerra Mundial. A situação em que o país se encontrava repercutia nas relações trabalhistas. As longas jornadas de trabalho, salários baixos, desemprego, exploração do trabalho infantil e a desvalorização da mão-de-obra feminina, foram fatores importantes que culminaram na Greve Geral de 1917.

È em meio a esse furor que nasce o jornal A Plebe, fundado pelo jornalista Edgard Leuenroth (1881-1968), que sempre esteve envolvido no desenvolvimento de diversos jornais libertários. O conteúdo do jornal tinha como base a discussão sobre a luta e resistência libertária no Brasil, a defesa dos princípios anarquistas como doutrina social que preconizava uma sociedade livre, bem como a organização sindical contra a opressão do Estado, e era publicado mensalmente.

Leuenroth usava o jornal não só para apoiar o movimento grevista, como também assumiu para si o papel de articulador da paralisação. Era considerado pela polícia o mentor “psico-intelectual” da greve, motivo pelo qual foi preso e processado. Sobre a prisão escreveu:

"Muito tempo ainda não havia decorrido, quando se verificou a minha prisão. Iniciou-se então minha peregrinação pelos postos policiais, com o fim de serem burlados os "habeas corpus" requeridos quando fui transferido para a Cadeia Publica, hoje Casa de Detenção. Após seis meses, fui levado ao Tribunal do Júri, para ser julgado pela estúpida acusação de ter sido o autor psíquico-intelectual da greve geral de julho de 1917. Fui absolvido por unanimidade de votos, após dois adiamentos, com o intuito de impedir de ter também como defensor, ao lado do dr. Marry Junior, o grande criminalista dr. Evaristo de Morais. Passado algum tempo, divulgou-se a notícia de deportação de alguns militantes proletários para outros Estados." (Edgard Leuenroth)

Por defender a causa operária, Edgard passou a colecionar desafetos da direita burguesa. A redação e gráfica do jornal seriam depredadas por estudantes da Faculdade de Direito de São Paulo revoltados com suas críticas, diante dos policiais que nada fizeram para impedir.

Outro fato marcante envolveu o nome do periódico, durante um espetáculo para arrecadar fundos para o jornal, quando o sapateiro operário Ricardo Cipolla, fundador do Centro Libertário Terra Livre foi morto a tiros no palco do Salão Leal Oberdan por Indalécio Iglesias, um espanhol que andava entre os anarquistas e queria ser policial.

Sua publicação foi interrompida em julho de 1924, ressurgindo apenas em fevereiro de 1927. O jornal teve sua ultima publicação em 1949.

Edgar Leuenroth permaneceu ativo em sua militância anarquista até falecer, aos 87 anos, por conta de um câncer hepático. Seu legado permanece vivo e ele, até hoje, é considerado um dos grandes nomes do jornalismo libertário brasileiro.


sexta-feira, 1 de maio de 2009

Ernesto Varela : O Repórter de Mentira, que fazia perguntas inesperadas a personagens de verdade

Perguntas incovenientes, personagens que figuravam e ainda figuram na cena política do Brasil, uma câmera, um microfone e um par de óculos vermelhos. Este era o cenário perfeito para um repórter audacioso que fazia perguntas que todos queriam fazer mas não tinham a oportunidade - e se a tivesse, talvez, não teriam a coragem para fazê-la. Ernesto Varela foi um personagem criado pelo jornalista e engenheiro Marcelo Tristão Athayde de Souza, o Marcelo Tas.

No início dos anos 80 um grupo de jovens se reunia toda a semana para brincar com o maior “boom” tecnológico da época: a câmera de vídeo. Fazer vídeos caseiros era a febre entre a juventude, similar ao que acontece hoje com a internet. Essa brincadeira reunia jovens universitários das mais diversas áreas como Psicologia, Cinema, Engenharia e Jornalismo. A brincadeira ficou grande e ganhou nome “Olhar Eletrônico”, e ficou ainda mais importante quando a turma foi convidada pelo apresentador Goulart de Andrade para trabalhar na televisão, fazendo pequenas inserções “jornalísticas” na programação, durante as madrugadas.

“ Na olhar eletrônico todos gostavam de trabalhar atrás das câmeras e não na frente delas” disse Marcelo Tas . "Todos se revezavam para fazer as reportagens”.

Certa vez, foi decidido que Marcelo Tas iria fazer uma reportagem acompanhado de um jovem e desajeitado cinegrafista: Fernando Meireles. Com criatividade decidiram que na produção iriam sugerir um meio revolucionário para acabar com a dívida externa brasileira(que nos anos 80 junto com a inflação era o grande fantasma que assombrava os brasileiros). A reportagem se deu em um terreno baldio em plena Avenida Paulista. Eles calcularam quantas bananeiras poderiam ser plantadas ali e por quanto poderiam ser vendidas. A sugestão: derrubar todos os prédios do maior centro econômico do país para se plantar bananas e vendê-las como pagamento da tal dívida.

“A Criação do Varela foi um meio para disfarçar a timidez em frente a máquina que acaba com toda a espontaneidade: a câmera”, conta Tas.


Varela, acompanhado de seu inseparável câmera o Valdeci (Fernando Meireles), cobriu fatos importantes como a Copa de 86 e a campanha das Diretas Já, além de ser a primeira equipe brasileira a ser autorizada por Fidel Castro a filmar livremente em Cuba. Também entrevistou pessoas ilustres como o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, os ex-governadores Franco Montoro, Orestes Quércia e Paulo Maluf, além do corredor Nélson Piquet.

A entrevista mais polêmica foi com Nabi Abi Chedid (vide vídeo) na época presidente da Confederação Brasileira de Futebol, a CBF, e homem forte na política. Na entrevista Chedid chamou Varela de mau brasileiro que fazia perguntas cretinas. Varela o deixou falando sozinho ao final da reportagem.

Ernesto Varela pode ser considerado o primeiro CQC , pois fazia um jornalismo sério, de serviço público, que abordava interesses diretos do povo com um toque de humor e ironia. Um jornalismo sério de conteúdo, disfarçado em um repórter de mentira com talento de verdade.
“Só percebi que não havia mais volta, que o personagem era realmente importante quando mandei meus documentos para o Congresso Nacional para retirar o meu crachá e depois de alguns dias me enviaram o crachá como o nome: ERNESTO VARELA” afirma Tas.


Guilherme Lorenzetti

Link:

http://www.youtube.com/watch?v=ouD3VwhOZIw&NR=1 (vídeo Ernesto Varela/ Nabi Abi Chedid)

quarta-feira, 29 de abril de 2009

"A Sangue Frio" e o nascimento do New Jornalism


A ideia de A Sangue Frio surge quando Truman Capote vê-se diante de um texto impresso no jornal The New York Times, onde era descrito o inexplicável assassinato de uma família de quatros pessoas na área rural do Kansas, nos Estados Unidos.

Capote agarrou-se de tal maneira à chocante história que foi ao estado não para escrever apenas mais um artigo sobre o fato, mas sim um livro inteiro (publicado primeiramente em quatro capítulos na revista The New Yorker). Pesquisou sobre a histórias durante seis anos, sem escrever uma linha sequer, e, ao publicá-la foi aclamado por ter inventado um gênero literário: o romance de não-ficção.

Anos depois, Tom Wolfe (The Electric Kool-Aid Acid Test, 1968) e seus companheiros incluiriam o título em seu próprio movimento, conhecido como 'New Jornalism' (no Brasil chamado de Jornalismo Literário).

À mais de 40 anos desde sua publicação, o radicalismo de A Sangue Frio é muito menos impactante; mas o livro continua sendo uma grande obra por descrever com riqueza de detalhes tanto o crime em si e seu desfecho, quanto os personagens envolvidos. O fato tomou então a forma de um romance ficcional, com narrador, introdução seguida de um breve desenrolar da trama, clímax e resolução. Os eventos que envolvem a morte da família Clutter formam a linha narrativa central.

Capote acreditava que o jornalismo era altamente subestimado e pouco explorado no meio literário, e que o jornalismo e a reportagem poderiam integrar-se à uma nova e importante forma de arte.

Publicado em 1965, A Sangue Frio mostrou aos jornalistas que era possível usar dos artifícios de uma técnica de redação criativa sem fugir dos termos e regras básicas de um texto jornalístico; algo visto hoje não só em livros mas também em revistas e jornais. Essa técnica, comum no exterior, tem sido, porém, pouco usada na imprensa brasileira nos dias de hoje. Atualmente, muitos veículos impressos vêem esse estilo como um dos pontos cruciais para manter seus leitores cativos.

Se escrito hoje, A Sangue Frio provavelmente não seria publicado sem significativas mudanças.Veracidade tem se tornado um dos elementos cruciais quando misturamos narrativa criativa e jornalismo.( Ao final do livro, Capote integra cenas e personagens que nunca existiram, segundo documentos oficiais.).

Os estudantes de jornalismo devem aprender um estilo de narrativa que vá além dos modelos e padrões. E nesse processo posso indicar o best-seller de Capote como um dos degraus de aprendizado.


Catharina Guadalupe

Foto: Irving Penn


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domingo, 26 de abril de 2009

Balzac e a introdução de jornalismo de mercado

Não é de hoje que muitos escritores atuam nas redações de diversos jornais e muitos jornalistas se lançam na carreira literária. Por diversos motivos: capacidade intelectual, necessidades financeiras ou até mesmo pela visibilidade trazida pelos meios de comunicação. Os motivos e razões são diversos e vão de acordo com o pano de fundo contemporâneo de cada um.
No entanto, essa relação não cria barreiras, acaba contaminando produtivamente ambos os ofícios (ver entrevista Marçal Aquino). Mas em nenhum outro escritor, essa relação causou tanto impacto como em Honoré de Balzac (1799-1850).

Balzac nasceu em Tours, França. Mudou-se para Paris com a família em 1814. Formou-se em direito em 1819. Estagiou por apenas três anos, revoltou-se com a influência que o dinheiro tinha no andamento da justiça e decidiu seguir carreira de escritor.

E o que o jornalismo tem a ver com isso? Bom, vamos entender como andava o mesmo naquela época.

Graças aos ideais da Revolução de 1789, a França tinha um papel fundamental na expansão de ideias por todo o mundo. Papel preponderante da imprensa. Porém, já no começo do século XIX, a imprensa começa a ser vista como mercadoria.

Frustrado em muitos sentidos da vida, sem dinheiro, mas dotado de uma boa capacidade de observação e uma veia sarcástica impressionante, Balzac, tido para muitos como o pai da Sociologia, nomeia sua obra de “Comédia Humana”, dividindo-a em três partes.

Na primeira parte é onde encontramos a obra mais trabalhada de Honoré. Nomeado de “Ilusões Perdidas”, o romance faz uma dura crítica ao jornalismo da época.

A obra trata dos esplendores e misérias de um poeta provinciano Lucien de Rubempré, que, em Paris, obtém sucesso somente quando entra para o jornalismo, mas cai em desgraça em boa

parte pelos próprios poderes ambivalentes da imprensa.

Segundo Rónai, que assina o a nota introdutória da primeira tradução do Brasil “A parte mais importante do livro é o segundo episódio, as vicissitudes de Luciano em Paris, onde ele passa por uma serie de ambientes. O [ambiente] dos jornalistas é aquele que leva Balzac a usar traços mais incisivos e as cores mais fortes, e lhe transforma as paginas numa sátira virulenta.” (Rónai, 1978, p.9). Em seu estudo sobre a obra, Bruno Gaundêncio relata que o romance focaliza o jornal em estado nascente, e traça uma analise financeira da indústria editorial, bem como do fenômeno da grande imprensa e das ficções de massas. “Além dos jornalistas, chamados de “negociantes de frases” e “espadachins das idéias e das reputações” há uma descrição rigorosa no livro de vários tipos de livreiros, contratos, tráficos de influência, sistemas de benesses e modos de oscilação dos preços do prestígio pessoal”, observa Bruno.

Balzac via o jornal como instrumento de vinganças pessoais, comprometimento político-partidário, interesses econômicos, amizades, etc. Em suma, de uma maneira maniqueísta, ele passa para ficção uma imprensa em pleno desenvolvimento que por estar aliada ao capital financeiro muitas vezes abandonava o interesse público. Algo que se tornou um costume e continua maltratando a ética na atual conjuntura do “jornalismo mercadoria”.



Texto e foto: Adriano Panisso

quinta-feira, 23 de abril de 2009

Daens, um grito de Justiça (Daens)

Dirigido por Stijin Coninx, "Daens - um grito de Justiça", indicado ao Oscar de melhor filme estrangeiro de 1993, conta a história real do Padre Daens (Jan Decleir), um homem que luta por justiça social na Bélgica do final do século XIX.

Enviado para a cidade de Aalst, no interior do país, Daens vai viver com seu irmão, um jornalista. Na cidade, depara-se com uma situação de miséria e exploração da classe operária: mulheres e crianças trabalhando em turnos de longa duração, recebendo salários irrisórios, em péssimas condições de trabalho (logo no início do filme há uma impactante cena que mostra a morte de uma criança dentro de uma fábrica).

Indignado, o Padre utiliza-se do jornal do Partido Católico para relatar essas agruras e divulgar ideias a fim de incitar as massas trabalhadoras a batalhar por condições dignas de trabalho e existência, além de propor o sufrágio universal, implementando um Estado democrático e justo.

Na defesa dessas ideias, Daens incomoda os industriários da época e a própria Igreja, aliada a eles. Passa, então, a ser perseguido.

Situado numa época de ampla divulgação de ideias dentro do jornalismo e de fortes mudanças na estrutura política, o filme retrata o surgimento dos jornais políticos, a utilização da imprensa como agente de mudanças sociais, a rivalidade entre ideologias políticas e o surgimento da Social Democracia, que prega a igualdade de oportunidades, ao invés da igualdade de fato pregada pelo Socialismo.

Além de uma narrativa envolvente aliada a uma fotografia seca e planos corretos, o filme conta com diálogos que sintetizam as questões da época e atuação sensível e consistente de Jan Decleir como o agoniado e determinado padre Daens.



Na foto acima, o verdadeiro padre Daens. Foto retirada do site: http://www.aalst.be/



Danilo Thomaz

sexta-feira, 17 de abril de 2009

O Tifis de Caneca


A Independência brasileira foi declarada em 1822, porém a dominação de Portugal se estendeu durante um período muito longo no país. Após a declaração, Dom Pedro I ficou na antiga colônia para, teoricamente, defender os ideais brasileiros. Na verdade, auxiliou mais Portugal do que o Brasil.

Nesse período, em que o Brasil tinha como representante um português, Frei Caneca edita seu jornal, o Tifis Pernambucano. O periódico circulou apenas de 1823 a 1824, mas teve grande importância nessa discussão sobre o “Brasil independente”.

Segundo a professora Cida Ruiz, que ministra aulas de roteiro para teledramaturgia, história do Jornalismo e orienta os projetos de TCC no curso de Rádio e TV da Universidade Metodista, as atividades daquela época tiveram grande importância com o jornalismo de ideias “Na região do Nordeste, que era de grande relevância para o país naquela época, os jornais contestaram o autoritarismo de Dom Pedro e o acusaram de ceder regalias a Portugal”, conta Cida.

O primeiro exemplar do Tifis Pernambucano, o jornal de Caneca, foi lançado no natal de 1823 com a notícia da dissolução da Assembléia Constituinte. Dom Pedro I criou a Constituição de 1824, onde deixava claros os propósitos liberais, mas também dava direito ao príncipe de se mostrar.
“Nessa época foi criado o quarto poder, o Moderador, onde Dom Pedro I tinha direitos como o Judiciário, o Executivo e o Legislativo”, diz Cida.

Frei Caneca, após escrever suas críticas ao governo no Tifis, se juntou a Confederação do Equador, que lutava contra a dominação do império. Nesse movimento ele encontrou seu fim.

Foi interrogado e acusado de disseminação de déias contra a boa ordem. Acabou morto em 13 de janeiro de 1825, com tiros de fuzil, após três pessoas se recusarem a enforcá-lo e um soldado passar mal antes do fuzilamento.




Carlos Ferreira

quarta-feira, 8 de abril de 2009

Folhetim: último capítulo


Como a história se desenrolou no Brasil e onde estão os folhetins nos dias de hoje.





Como foi dito quarta-feira passada, os folhetins surgiram na França no século XIX e se caracterizavam por serem pequenos trechos de romances ou contos que no final de cada capítulo deixavam ganchos, para que o leitor continuasse a acompanhar a história.

No Brasil, eles surgiram pouco tempo depois de estabelecidos na Europa, com o intuito de fazer a população ler e comprar mais jornais. Eram publicados diariamente em periódicos por todo o império, fazendo com que as tiragens aumentassem exponencialmente e que autores brasileiros tivessem uma maior visibilidade e prestígio junto à população. Tanto é que José de Alencar, Machado de Assis, Lima Barreto, Joaquim Manuel Macedo e vários outros tiveram suas principais obras publicadas em jornais antes de virarem livros (A Moreninha, de Joaquim Manuel Macedo foi o folhetim mais popular na história do Brasil).

Com o advento de novas mídias de comunicação, cultura e entretenimento, os folhetins foram deixados de lado pelos jornais e incorporados a esses novos meios. O rádio, por exemplo, começou a dramatizar a dramatizá-los, criando assim as radionovelas. Já a televisão buscou na linguagem folhetinesca aspectos que pudessem ser utilizados no formato televisivo, como os ganchos no final dos capítulos e a abordagem de temas populares e polêmicos.

Atualmente o gênero continua dando muita audiência nas telenovelas e seriados de TV. Outro fato curioso é que os livros que se aproveitam dessa idéia e são publicados em vários volumes, popularizam-se cada vez mais e ganham um grande espaço nos cinemas, como é possível observar na trilogia Senhor dos Anéis de J.R.R Tolkien, na saga Harry Potter e na série Crepúsculo, o novo fenômeno teen.

Enquanto esse formato ganha mais e mais admiradores em outros meios, os jornais perdem leitores todos os dias. Seria sensato olhar para trás e ver como os folhetins ajudaram os periódicos diários a saírem de tempos difíceis e tentar incorporá-los às suas páginas, com uma nova roupagem, para ver se conseguimos mais uma vez prolongar existência desse meio de comunicação que vem resistindo há mais de dois séculos.

Gustavo Chiodetto